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NÚCLEO MEMÓRIA

Direitos humanos |   Sábado Resistente: Direitos Humanos em Foco “A questão migratória e o fenômeno da xenofobia”

Neste ano, foi estabelecido que os Sábados Resistentes refletirão sobre a universalidade, a indivisibilidade e a interdependência dos direitos humanos e as lutas por cidadania, sendo o ciclo 2021 intitulado como Direitos Humanos em Foco. Devido à continuidade da pandemia, a atividade está sendo realizada no formato virtual através do canal do Núcleo Memória do Youtube e dos perfis no Facebook, tanto do NM quanto do Memorial da Resistência. Agradecemos a importante parceria do Tutaméia que retransmitiu o debate em seus canais. Os link’s de acesso ao debate podem ser encontrados no final deste texto.

Os convidados deste Sábado Resistente foram Helisane Mahlke, professora na Universidade Presbiteriana Mackenzie, doutora em Direito Internacional pela USP, mestre em Relações Internacionais pela UFRGS, autora do livro “Direito Internacional dos Refugiados: Novo Paradigma Jurídico”; Jobana Moya, imigrante boliviana humanista, ativista pela Não Violência Ativa e a Não Discriminação, mediadora intercultural, fundadora da Equipe de Base Warmis Convergência das Culturas; Willians Santos, doutorando em Ciências Sociais pela Unicamp e professor de Sociologia do Estado de São Paulo, integrante da Rede “Fronteiras Cruzadas”, desenvolve pesquisa nas temáticas de imigração e refúgio, racismo e xenofobia e arte de imigrantes e refugiados no Brasil, ator com pesquisas em teatro e curador musical do projeto “Conexão Jamaifrica”. A apresentação da atividade foi realizada por Maurice Politi, diretor do Núcleo Memória e de Ana Pato, coordenadora do Memorial da Resistência, e a mediação de César Rodrigues, historiador e pesquisador do Núcleo Memória.

A professora Helisane Mahlke iniciou dizendo que a reflexão pretendida por ela no evento é da imigração como parte de um discurso político. Ao abordar o conceito de migração, apontou que é um fenômeno da mobilidade humana pensado como um movimento natural, atravessada por questões históricas, políticas e econômicas. Explicou que o conceito da palavra estrangeiro, que tem um caráter pejorativo, vem de extranĕus, que significa aquele que é estranho, que é de fora, que não detém os mesmos direitos dos cidadãos de uma determinada sociedade e país, e que isso vale atualmente. Também falou sobre o processo de constituição da nova lei migratória de 2017 e das dificuldades encontradas nas discussões de sua elaboração e regulamentação. Ao abordar a politização da imigração, explicou que esta é “a manipulação do contexto migratório para fins políticos, que acaba por fortalecer justificativas equivocadas para que os imigrantes não tenham os seus direitos reconhecidos, sendo mais vulneráveis a eventuais violações de direitos humanos”. Em diferentes contextos históricos, o imigrante é colocado como culpado preferencial, segundo a professora Helisane, muito por causa da incompetência dos Estados em não saber lidar com suas próprias questões internas. Esse discurso xenófobo tem sido mais apropriado por movimentos políticos de extrema-direita, uma vez que o medo contido na ideia de xenofobia sempre foi um instrumento eficiente de controle e manipulação. Pesquisas demonstram que a imigração é benéfica e que sociedades diversas são potencialmente mais ricas culturalmente, com maior capacidade de desenvolvimento humano e socioeconômico. Para modificarmos a discriminação com relação aos imigrantes, não cabe sermos “tolerantes”, pois esta é uma perspectiva de superioridade ao outro, uma vez que permite benefícios a outrem desde que não interfira nos direitos individuais daqueles que estão tolerando. Também é equivocada a forma como alguns países lidam com os imigrantes ao trabalhar com o conceito de “assimilação”, pois isto representa renúncia às suas identidades, origens e culturas, forçando uma adaptação e aculturação que no fundo nada mais são do que uma prática violenta. Helisane aponta que o ideal é que possamos incluir a população migrante na sociedade local, significando o reconhecimento de todos enquanto sujeitos de plenos direitos, concedendo-lhes autonomia para viverem suas próprias vidas, respeitando suas identidades. Finalizou afirmando que as transformações das sociedades alteram padrões de poder, o que incomoda muito àqueles que não desejam isso e que são os grandes propagadores da xenofobia. O que pode reduzir essa perspectiva da manutenção da ignorância e do medo daquele que é diferente é o conhecimento, a educação e a inclusão, que dão legitimidade ao outro, permitindo a construção de uma sociedade mais rica e mais diversa. Esta é uma tarefa contínua.

A segunda a falar foi Jobana Moya, mediadora intercultural e imigrante boliviana. Disse que é importante questionarmos os nacionalismos, que têm conformado os países como herança da colonização, sem questionar se antes das invasões, tanto nas Américas quanto na África, existiam povos que ali já residiam há muitas gerações. A construção forçada e imposta de um Estado-nação se deu por meio do apagamento da diversidade e das línguas nos territórios e leva ao desconhecimento, à desvalorização e ao estranhamento que sentimos quando nos deparamos com o diferente. É preciso conhecer o contexto histórico para compreendermos o fenômeno da xenofobia. Segundo Jobana, tendemos a projetar no outro tudo aquilo que não temos bem resolvido internamente. Isso leva, por exemplo, a não reconhecer os indígenas como cidadãos de um país, mas como se estivessem à parte, ou, ainda, como se fossem estrangeiros em sua própria terra. A xenofobia leva a tratá-los como selvagens, como desconhecidos, levando muitos a se sentirem superiores. Neste sentido, é importante levar em conta que os governos dos países colonizados ajudam a fomentar a prática cotidiana de preconceitos, pois eles próprios têm somente dois modelos a seguir como referência: os EUA e a Europa. Assim, nunca se busca a construção de um modelo próprio, principalmente com relação às temáticas de imigração e refúgio. Para Jobana, o direito de migrar deveria ser um direito social, assim como já o são o acesso à educação, à saúde e à moradia. Estamos em um contexto de migrações com tentativas de organizar os deslocamentos, mas que no fundo têm a intenção do controle sobre o outro, o que significa uma prática violenta. Essa violência se manifesta de diversas formas, e não só em relação aos imigrantes, por isso é preciso trabalharmos com a educação da não-violência e com a valorização da diversidade e da igualdade de condições para combatermos a xenofobia.

O professor Willians Santos iniciou falando sobre a importância da luta dos imigrantes, em especial no processo de construção da lei de imigração, pois ajudou a abrir os olhos dos brasileiros sobre os preconceitos que reproduzimos cotidianamente, contrariando a ideia de sermos um país multicultural e acolhedor. São os imigrantes que nos ajudam a denunciar essa contradição. Disse que o processo imigratório produz alteridades, que considera aquele que chega como o “outro” em relação ao cidadão de uma nação, levando esse outro a ser subjugado por sua diferença. Sublinhou que muitos estudos apontam que os processos de racialização são constitutivos da migração que, por sua vez, sofrem com os processos de racialização que as sociedades possuem. Isto é percebido nas diferenças de recepção que imigrantes europeus têm em relação ao tratamento fornecido a imigrantes de países da América Latina e África. Willians mencionou alguns casos ocorridos nos últimos anos contra esse perfil de imigrantes para ilustrar sua fala, bem como trouxe reflexões de pensadoras e pensadores que estudam o tema. Por fim, disse que a maneira como as sociedades se organizam socialmente atravessam a vida dos imigrantes, seja de primeira, segunda ou terceira geração.

Em seguida, o mediador e historiador César Rodrigues apresentou questões para os convidados feitas pelo público virtual que acompanhava o evento através dos canais do Núcleo Memória no Youtube e Facebook, do Facebook do Memorial da Resistência e dos canais do Tutaméia, que mais uma vez retransmitiram o evento. Esta segunda parte teve aproximadamente uma hora de estimulante debate.

A atividade pode ser conferida na íntegra através dos seguintes endereços:

Núcleo Memória (Youtube): https://youtu.be/zGBLZivGv10  

Núcleo Memória (Facebook): https://fb.watch/7MSP0RHS_j/

Memorial da Resistência de São Paulo: https://fb.watch/7MSSAI4o9x/

Tutaméia (Youtube): https://youtu.be/CcPhocE2_MM

Tutaméia (Facebook): https://fb.watch/7MTagRVI7W/

 

Outros link’s de assuntos citados no evento:

- Currículo da Cidade de São Paulo / Povos Migrantes - Orientações Pedagógicas: https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2021/06/Curr%C3%ADculo-da-Cidade-Povos-Migrantes-WEB.pdf?fbclid=IwAR19uk4EgRoJa71h6BHRdMPk_bcC-gOopVz0sXXex-MoAt-RR2wMj6llz-w

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